Até agora, os
intelectuais, especialistas e tecnocratas especulam, no afã em compreender o
fenômeno da onda de protestos que se sucede, de forma inesperada, tomando as avenidas
das grandes capitais, onde a vida já é insuportável e, frente a tanta inércia
política, só resta mesmo ir para as ruas e barganhar algum direito à cidadania
e alguns centavos.
No fundo, é o
sonho neoliberal que cai por terra, justamente quando o país é comandado por um
governo “trabalhista”, que, em mais de uma década de poder, foi incapaz de realizar as
reformas necessárias, ou pelo menos dar alguma promissora perspectiva de
mudança, que fizesse o povo crer que daqui pra frente tudo seria diferente. A ideia
de uma sociedade mais justa e igualitária foi esmagada pelo rolo compressor da corrupção
e da gritante concentração de renda.
Na era da
globalização, do neoliberalismo, da sociedade de consumo e do individualismo
não há lugar para o Estado de direito e igualitário. Principalmente num país
com cultura politicamente medíocre, como é o caso do Brasil, em que o voto é
moeda de troca e barganha. Neste contexto, para que o sistema político se
sustente ele necessariamente tem de ser corrupto. É como um ciclo vicioso, numa
simbiose entre corruptor (político) e corrompido (povo). Um depende e não vive
sem o outro.
Quando os
manifestantes se colocam contra ou impedem a presença de bandeiras partidárias
nos protestos, primeiro, o que está se demonstrando é ojeriza em relação ao
sistema político e, segundo, exorcizando a própria culpa, por contribuir e ser
cúmplice com este mesmo sistema que ajuda a reproduzir. Mas, é um erro impedir
que partidários se manifestem, com suas ideologias e bandeiras, pois também são
muitos os que lutam de forma honesta e coerente, através das agremiações,
inclusive para moralizá-las internamente. O problema não está nas agremiações e
sim no sistema neoliberal.
Outro ponto
importante é a questão do poder da rede (internet), neste processo. Na verdade
o assunto de que se trata é a quebra do monopólio da grande mídia, representada,
principalmente, pela mídia televisiva. O que se demonstra é o fim do controle
da informação pelas grandes emissoras, as quais, desde a ditadura militar, permitiam
que houvesse a passiva “unidade nacional” em um país continental. Sem dúvida, a
internet, em especial, a rede social, rompeu com este controle para estabelecer
uma nova ordem ou identidade política, de norte a sul, sem que a informação
viesse a ser propagada por um único meio ou canal. Só restou às redes de tevês
também aderirem aos manifestos, sob a velha retórica democrática da liberdade de
expressão.
O que virá daqui
pra frente e o resultado disto tudo, por enquanto impossível prever. Pode ser
apenas uma onda, que quebre na praia e se desfaça. Quem sabe, uma nova
estratégia manipuladora venha a absorver os movimentos, com novas promessas, e
as coisas voltem à “normalidade”. Até quando e em que proporção se manterão os
protestos, ainda é uma incógnita. A única certeza é de que uma barreira foi rompida
e que o amanhã ainda está por fazer. Se os acontecimentos servirem, de fato,
para aprofundar o debate político no Brasil, com o povo como o principal
protagonista, podemos começar a ter, aí então, uma esperança renovadora de país
melhor.
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